Corpo e Sangue do Senhor: alimentos de salvação

Das Homilias de São Gaudêncio de Brescia (séc. V), bispo:



O sacrifício celeste instituído por Cristo é verdadeiramente a herança legada pelo Seu novo testamento; Ele no-la deixou na noite em que ia ser entregue para ser crucificado, como garantia da Sua presença.

Ele é o viático da nossa viagem, o nosso alimento no caminho da vida, até chegarmos à outra Vida, ao deixar este mundo. Era por isso que o Senhor dizia: «Se não comerdes a Minha carne e não beberdes o Meu sangue, não tereis a vida em vós».

Ele quis que os Seus benefícios permanecessem entre nós; quis que as almas resgatadas pelo Seu sangue precioso fossem sempre santificadas à imagem da Sua própria Paixão.

Foi por essa razão que ordenou aos Seus discípulos fiéis, que estabeleceu como primeiros sacerdotes da Sua Igreja, que celebrassem estes mistérios de vida eterna.

Com efeito, a multidão dos fiéis devia ter todos os dias diante dos seus olhos a representação da Paixão de Cristo; ao segurá-la nas nossas mãos, ao recebê-la na boca e no coração, ficaremos com uma recordação indelével da nossa redenção.
É preciso que o pão seja feito com a farinha de numerosos grãos de fermento, misturada com água, e receba do fogo o seu acabamento. Encontra-se aí, portanto, uma imagem semelhante ao corpo de Cristo, pois sabemos que Ele forma um só corpo com a multidão dos homens, que recebeu o seu acabamento do fogo do Espírito Santo.

Do mesmo modo, o vinho do Seu sangue é extraído de diversos cachos de uvas, isto é, de uvas da vinha plantada por Ele, esmagadas sob o peso da cruz; vertido no coração dos fiéis, aí se agita pelo seu próprio poder.


É este o sacrifício da Páscoa, que traz a salvação a todos os que foram libertados da escravidão do Egito e do Faraó, isto é, do demônio. Recebei-o em união conosco, com toda a avidez de um coração religioso.

Pobre para nos enriquecer, servo para nos fazer filhos

Dos Sermões de Santo Agostinho (354-430), bispo e doutor da Igreja:


Quem, pois, dentre os homens, conhece todos os tesouros de sabedoria e da ciência ocultos em Cristo, escondidos na pobreza da Sua carne? Porque Ele, «sendo rico, fez-se pobre por nós, para nos enriquecer com a Sua pobreza» (2Cor 8, 9). Como vinha para assumir a condição mortal e vencer a própria morte, apresentou-Se na Sua condição de pobre; mas Ele, que nos prometeu tesouros distantes, na verdade não perdeu aqueles dos quais Se afastou: «como é grande, Senhor, a bondade que reservas para os que Te são fieis! Tu a concedes, à vista de todos, àqueles que em Ti confiam» [Sl 31/30,20].

Para que O pudéssemos compreender, Aquele que é igual ao Pai, pois tem a natureza de Deus, tornou-Se semelhante a nós, tomando a natureza de servo, e recriando-nos à semelhança de Deus. Tornando-Se filho de homem, o Filho único de Deus torna os homens filhos de Deus. E, depois de ter alimentado os servos com a Sua natureza visível de servo, tornou-nos livres para que pudéssemos contemplar a natureza de Deus. Porque «já somos filhos de Deus, mas não se manifestou ainda o que havemos de ser. O que sabemos é que, quando Ele se manifestar, seremos semelhantes a Ele porque O veremos tal como Ele é» (1Jo 3,2). Com efeito, em que consistem os tesouros de sabedoria e de ciência, esses tesouros divinos? Só sabemos que nos satisfazem completamente. E esta superabundância da Sua bondade? Só sabemos que nos saciará.